15 julho 2006

Quinteto Armorial - Do Romance ao Galope Nordestino (1974)

Capa do disco
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Quinteto ArmorialQuantas vezes, na história de qualquer país do mundo, se conseguiu fundir em uma dúzia de peças musicais o regional no universal, e o popular no erudito? A julgar pela trajetória da cultura ocidental, onde a tendência da diversificação social urbana é sempre a de afastar os dois tipos de criação, através do alargamento das distancias entre povo e elite, esses momentos de reconhecimento mútuo de padrões culturais comuns não foram muitos. Por isso mesmo, o aparecimento de um desses raros exemplos no Brasil - neste mesmo instante em que a tendência é considerar "universal" a média descaracterizadamente musical produzida ao nível da cultura de massa - só pode ser saudado como um milagre.

O milagre, no caso, é representado pelas músicas do LP Quinteto Armorial - Do Romance ao Galope Nordestino, lançado pelos Discos Marcus Pereira sob o número 403.5025, e que torna público o trabalho realizado desde 1970 no Recife pelo Quinteto Armorial, sob a liderança e a orientação do teatrólogo Ariano Suassuna.

Decididos a realizar um levantamento da sobrevivência da música renascentista - que na península Ibérica casou processos de cantos árabes com o som das vihuelas, e sob o nome de romance ainda pode ser ouvida no Nordeste - Suassuna e os cinco jovens componentes do Quinteto Armorial foram buscar no canto dos cegos e nos benditos e incelenças da religiosidade popular um tesouro de sugestões musicais.

É esse material, maravilhosamente recriado (e não pastichado e mal disfarçado por enfeites de uma sovada harmonia erudita romântica, como foi tão comum na chamada Música Nacionalista), que o Quinteto Armorial revela agora, em 12 composições de um nível raramente atingido dentro da música brasileira, erudita ou popular.

Ao som da viola sertaneja do compositor Antônio José Madureira, da rabeca o violino de Antônio Carlos Nóbrega de Almeida, do violão de Edílson Eulálio, do pífano e flauta de Egildo Vieira e do marimbau de Fernando Torres, composições como Revoada e Ponteio Acutilado transportam numa ponte de quatro séculos a Renascença para o Nordeste, para repetir a experiência fantástica da fusão da plangente monodia do marimbau dos cegos com a polifonia do violão, esse descendente do alaúde, enquanto o viola soa cortante e metálica com um clavicórdio.

Embora seja impossível destacar qual a melhor faixa desse LP surpreendente e maravilhoso, onde tudo é perfeito, não se pode deixar de chamar a atenção para a composição intitulada Rasga, do jovem tocador de rabeca e violino Antônio Carlos Nóbrega de Almeida, que fecha o disco na última faixa com uma consagração definitiva. Não sabemos se o autor intitulou sua composição de Rasga numa alusão ao toque de viola denominado de "rasgado", em que as unhas do tocador apenas raspam as cordas, mas - embora ele talvez nem sonhe - sua composição não passa de variações em torno de uma chula gaúcha. De jato - e isto é realmente surpreendente, porque revela afinal a unidade subjacente da cultura popular brasileira, apesar de todas as deformações a que tentam sujeita-la através da massificação dos sons da moda - o tema central usado por Antônio Carlos Nóbrega de Almeida pode ser ouvido na chula, dança gaúcha, recolhida e adaptada por Barbosa Lessa e Paixão Cortes, que a gravou em 1962 no LP da Philips Folclore do Pampa - Paixão Cortes (P 632.103 L). Como afirmação de unidade cultural, num país marcado por tantas diferenças aparentes, isso não deixa de ser sensacional - e revelador.

Culturalmente tão importante quanto está sendo importante economicamente à descoberta de petróleo da bacia de Campos, o disco Quinteto Armorial - Do Romance ao Galope Nordestino, também deveria ser saudado em manchetes, por todos os jornais. Porque se a descoberta de novos lençóis de petróleo anuncia a perspectiva de um desenvolvimento independente da "ajuda" das empresas multinacionais, a revelação musical do Quinteto Armorial vem mostrar que, das profundezas da criação popular, também se pode tirar uma cultura autenticamente nacional.

Quem ouvir, dirá se não estamos com a razão. Mas, pelo amor de Deus, não deixem de ouvir.

Ainda sem uma programação definida para o Rio, o Quinteto Armorial será lançado oficialmente em São Paulo em três espetáculos, um para críticos e convidados e os dois outros abertos ao público, a preços populares. Sábado próximo, no Teatro Municipal, e domingo, na concha acústica do Ibirapuera, os concertos terão o patrocínio do Departamento de Cultura da Prefeitura Municipal de São Paulo; na segunda-feira é a própria Discos Marcus Pereira quem promove o espetáculo especial para convidados, no Museu Lazar Segall. O lançamento em São Paulo será complementado por diversas apresentações em TV, devendo o mesmo ocorrer no Rio, provavelmente em fins de janeiro.

José Ramos Tinhorão - Jornal do Brasil - Rio de Janeiro - 10/12/1974 - extraído do site do Antônio Nóbrega

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Antonio MadureiraOne of the most important groups that brought together Brazilian classical and popular/folkloric musics, the Quinteto Armorial was derived from the Armorial Movement, led by Ariano Suassuna. Their work consisted of the adaptation and execution of Brazilian Renaissance pieces and European medieval-influenced ones, inspired by the Northeastern folklore. Formed in 1970, the first formation of the Quinteto Armorial was absorbed by the Orquestra Armorial de Câmara, which performed in Rio de Janeiro and São Paulo. The group was awarded with the São Paulo's Association of Art Critics' award (APCA) in 1974, the year in which they recorded Quinteto Armorial — Do Romance ao Galope Nordestino (Marcus Pereira). They recorded three more albums until 1980, when was dissolved.

Alvaro Neder - extracted from All Music Guide

4 comentários:

Anônimo disse...

Thanks so much for posting this!

e.c.

Anônimo disse...

MV, adoro esse disco! Mas não consigo baixá-lo: dá erro no Turbo Upload. Será que você consegue contornar o problema?
Obrigada por esta escolha e pelas outras do site, que só tem coisa boa.
Ana Lúcia

mvcosta disse...

Quinteto Armorial - "Do Romance ao Galope Nordestino" (1974 - Marcus Pereira 403.5025)

1. Revoada
(Antônio José Madureira)

2. Romance da Bela Infanta
(Romance ibérico do século XVI, recriado por Antonio José Madureira)

3. Mourão
(Guerra Peixe)

4. Toada e Desafio
(Capiba)

5. Ponteio Acutilado
(Antonio Carlos Nóbrega de Almeida)

6. Repente
(Antonio José Madureira)

7. Toré
(Antonio José Madureira)

8. Excelência
(Tema nordestino de canto fúnebre, recriado por Antonio José Madureira)

9. Bendito
(Egildo Vieira)

10. Toada e Dobrado de Cavalhada
(Antonio José Madureira)

11. Romance de Minervina
(Romance nordestino, provavelmente do século XIX, recriado por Antonio José Madureira)

12. Rasga
(Antonio Carlos Nóbrega de Almeida)


Antonio José Madureira: viola sertaneja
Edilson Eulálio: violão
Fernando Torres Barbosa: marimbau nordestino
Egildo Vieira: pífano, flauta
Antonio Carlos Nóbrega de Almeida: rabeca, violino

Produção de Aluizio Falcão
Técnico de som: Marcus Vinícius
Estúdio Eldorado

O marimbau e a rabeca usados pelo Quinteto Armorial foram fabricados e restaurados pelo artesão popular nordestino João Batista de Lima

taki disse...

gracias!

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